Existo. Ou não

Sou loira dos olhos negros. Inventada. Sou a personagem em mim que esteve atenta o tempo todo, a que guardou, quebrou, misturou e pintou essas histórias. Sem ela, eu simplesmente não aprendo. Não conseguiria. Eu posso ser outras pessoas, uma grande alegria na vida duns, uma grande tristeza na vida doutros, mas, se escrevo, sou Cassandra. Se não sou, digo a ela: Cassandra, que saco! E a gente sai por aí. Discutindo e tomando uns goles. E a gente se mistura. A gente se conforta. Em Uberlândia, minha Macondo, minha London, minha Paris. O Alfredo? É meu incidente, reincidente.

segunda-feira, 28 de março de 2011

Ficção X realidade

Uma pessoa do (no) twitter discorda, e por isso twitta ou bloga, ou bloga e twitta o post, sobre sua discordância, descontentamento, com a atitude de outra pessoa que twittou anunciando seu suicídio e explicando que o faria porque o namorado havia pouco (não sei ao certo o quanto) antes se suicidado. O que sei das pessoas envolvidas resume-se a fotos escolhidas à dedo por elas mesmas e espalhadas net afora. É provável - mas, nem isso se poderia afirmar - que os próprios envolvidos não se conheçam e tenham sobre si mesmos o mesmo parco conhecimento baseado em imagens e frases escolhidas a dedo e espalhadas pela net, tudo num tom de: "bom dia" "estou no shopping" "gosto de bananas", isso, levando-se em conta que os mortos envolvidos agora já mais nada sabem, blogam ou twittam.

Não posso dizer o mesmo de Thomas, Tereza e Sabrina, de quem conheço pesadelos, aflições, fantasias sexuais e, dos primeiros, inclusive a morte um tanto romântica e conjunta. Posso dizer de Tereza, que nos conta também sua amarga infância, que quase lhe conheço toda a vida. Mas, é claro, nenhum dos três existem.

Também se diz que o texto todo deveria estar contido no primeiro parágrafo para entender-se com o tempo escasso atual dividido entre twitts, posts, e papparazzis. Os textos longos não podem esconder segredos, os segredos devem ser logo revelados aos olhos ágeis que miram lá e, simultaneamente, a pizza e o café engolidos, assim como o que se lê, seriamente pouco nutritivos.

Então, à realidade anêmica que se desenha falta qualquer substância, como se pudesse à realidade faltar a própria matéria prima que a constrói: carne, osso, sentimentos indesejáveis. Os personagens criados são mal escritos e mal desenhados, embora, sempre bem fotografados. O que não sabem os maus autores é que com a ficção não se brinca porque castelos de areia não se sustentam. Altura, peso, cor dos olhos, roupas e gostos musicais, pouco explicam. Penso, por exemplo, que a Tristessa repentina tenha verdadeiros contornos de realidade e que, o que me atraia nos livros com segredos escondidos bem longe do primeiro parágrafo, não seja a ficção construída, mas a realidade bem desenhada.

Seria desolador pensar que os robôs de busca conheceriam os autores por trás dos personagens melhor do que eles mesmos. Assim como são desoladoras as melhores ficções científicas. Saber que os que sabem são tão pouco humanos. Que ficção estúpida assim se cria. E vão dizer que eu me escondo no mundo dos livros, uma bobagem que os próprios robôs de busca não diriam.

Nenhum comentário: