Eu estava um pouco elétrica naquela noite, embora eu não seja rápida, nem brusca. Embora eu mire horizontes imaginários.
Era a coisa infantil que eu tinha, de trepar na estante para alcançar o rum na última prateleira, ir até o quintal apanhar o limão galego, acrescentar duas colheres de açúcar e gelo, porque a limonada dos adultos era sempre mais gostosa.
Era a coisa infantil que eu tinha de dançar a música do fofão imaginando que realmente o chão era feito de nuvens, macio como algodão.
Eu estava um pouco elétrica, mas só por dentro. Com um copo de caipirum na mão eu me enfiei no meio da pista de dança, bem no meio. Eu estava um pouco elétrica e aqui já era adulta.
A loira ao meu lado não tinha dificuldade em equilibrar seus poucos quilos sobre o salto agulha, requebrou os ossos e, se a música não estivesse invadindo cada órgão do meu corpo – de tão alta e vibrante – eu poderia ouvir os ossos da loira tilintar.
O cabra atarracado ao meu lado tinha se ajeitado para parecer bonito mas se esquecera das coisas por causa da música alta e parecia muito preocupado em movimentar seus ombros enquanto batia o pé direito e segurava uma cerveja com a mão esquerda.
Eu não era rápida nem brusca. Era a coisa infantil que eu tinha, como uma eletricidade que parte do estômago e não se sabe onde, nem quando termina. Você estava na minha frente. Eu me joguei em seus braços e você me rodopiou, depois dançamos tango, depois samba, eu tomava caipirum.
Então nos casamos. Uma multidão se aproximou, nos cercou, tirou fotos. E era como se depois de nós, o mundo não existisse, fosse tudo multidão.
Derrubamos árvores, fizemos uma cerca, devastamos o planeta para salvar nossos filhos, dar-lhes de comer. Muitos anos se passaram e nunca mais dançamos tango. O nojo invadiu cada fresta e nos separamos.
E com um copo de caipirum na mão, eu me pergunto: o que aconteceu com a eletricidade que eu tinha? Ou: às vezes é melhor sair só para dançar.
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